• Sertão d''''água

No trabalho de foguista do Purus conheceu a linha toda, cada trapiche, cada ponto de lenha. Gostava do serviço no calor da caldeira, de andar pelo convés, dos ajudantes, de falar com os caboclos daqueles pontos mais escondidos. Gente que lidava com a juta, talhando seringa ou tirando lenha. Na sua primeira viagem encontrou no trapiche de Óbidos um guarda-livros que tinha vindo de muito longe e ficava olhando o rio e dizendo: – É um sertão d’água esse lugar... Sabá gostou tanto daquele modo dele falar: “sertão d’água”... “sertão d’água”... Foi também nessa primeira viagem que conheceu Maria Pipira exibindo os seios fartos num vestido de
gorgorão azul moqueando a piramutaba e servindo aos passageiros e ao comandante Fontenele, enquanto o Purus aguardava a estiva. Ofereceu de longe a cuia, chamando. Ele foi, ela gostou, chamou pros fundos. Na rede se tiveram a primeira vez, daquele dia em diante virou rabicho. Na baía de Aramanaí, a vez primeira que viu os tapuios em muitas montarias ladear o Purus com os corpos pintados de jenipapo e urucu, ajaezados de penas, gritando ritmado. Imaginou guerra à toa, era festa deles. Adelmo riu de Sabá, enquanto moldava a balata no formato do macaco. Rapinha era nascido na Jaroca, mas falava que tinha sido criado na Ponta do Jariúba
trabalhando barro. Adelmo ria: – Por isso os tamanhos pés, igual curupira... tal qual... tal qual... Sempre me fascinou a literatura regional: o conto, a poesia, o folclore, o romance. O mapeamento do Brasil, através dos escritores, está em minha estante. E Quinan faz parte dela com seu Sertão d’Água da Região Norte. Seu linguajar
amazônico me põe na Província do Grão-Pará, me faz conversar com os caboclos, me bota a navegar pelos rios. O romance é bonito e bem construído, com diversas estórias entremeadas em torno do personagem central Sabá do Talho que, no imaginário popular, virou visagem. Típico enredo saído da fabulosa capacidade do povo
de transformar em lenda qualquer caso comum. Quinan mexe com isso com maestria. Mistura mídia, política e poder religioso com a crendice mais primitiva, a ingenuidade mais pura e o exagero mais curioso de quem, contando um conto, aumenta um ponto. Estão citados, no meio da trama, o dialeto índio, as meizinhas do
mato, os barcos e barqueiros da Baía do Guajará, o mercado Ver-o-Peso, famoso até no Sul, onde se compra toda espécie de poção, garrafada, amuleto, comida e artesanato (bom de se reunir pra uma prosa regada a cachaça de infusão). Há também, além das assombrações dos ribeirinhos, das desavenças de amor, ciúme e traição, dos caciques da Imprensa, do Governo e da Igreja, a grande festa anual do Círio de Nazaré, o evento mais conhecido do lugar. Tudo isso já dá a dimensão do que é esse livro e do que encanta o seu autor. E aquilo que o encanta a mim me carrega numa viagem mágica. Embarquemos, pois, leitor, juntos, na canoa de Quinan,
pra esse maravilhoso Sertão d’Água.
Paulo César Pinheiro

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Autor Quinan Marcos
Editora Scortecci Editora
Idioma PORTUGUES
Encadernação BROCHURA
Páginas 140
Ano de edição 2021

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